Pagamento Baseado em Valor. Paradigmas precisam ser quebrados. Case Hospital São Marcos
A relação entre os prestadores de serviços, indústria, médicos e financiadores do sistema no segmento de saúde nunca foi muito amistosa devido aos interesses antagônicos e fragmentados de cada parte. A teoria da soma zero, de 1928 de Jon Von Neumann se faz presente nos dias de hoje em nosso modelo de financiamento e se baseia na perda de uma das partes para que se haja um ganhador.
O sistema de saúde brasileiro, alicerçado por um modelo de financiamento parecido e sustentando em seu pilar pelo autofágico fee-for-service – quando se remunera pela quantidade – vem perdurando até os dias de hoje e causando um estrago na sustentabilidade do sistema.
Tenho acompanhado de perto, desde 2009, várias iniciativas e esforços no sentido de mudar esse modelo e de lá para cá paradigmas vem sendo quebrados, mudanças e ensaios vem acontecendo, algumas lentas, outras fracassadas, mas algumas com grande êxito. Um exemplo de avanço é a criação de associações e instituições como a exemplo do IBRAVS Instituto Brasileiro de Valor em Saúde que desde 2018 vem provocando um diferencial na implantação de modelos mais efetivos e voltados para a geração de valor no sistema de saúde brasileiro.
Entendo que iniciativas como esta, entre outras, que buscam promover mudanças culturais, estão encontrando dificuldades devido aos modelos arraigados e antigos, mantidos pelos financiadores do sistema e a quebra destes paradigmas ainda é um desafio de médio e longo prazo a ser vencido. Case: Oportunamente, em uma instituição hospitalar no interior de São Paulo, o Hospital São Marcos buscamos desenvolver soluções alinhadas às necessidades de quem financia seus clientes, que são as operadoras de planos de saúde. Desta forma temos provocado estes financiadores a pensar fora da caixa e direcioná-los ao pensamento do pagamento pelo valor, pelo resultado das entregas, pela efetividade. Mas, não tem sido fácil. Parece que estamos falando línguas diferentes e eles ainda insistem em negociar como há anos fazem, buscando pagar o mínimo (im)possível, ainda que seus beneficiários fiquem mais tempo nas internações, não se obtenha resolutividade nos casos ou pior, se reinternem. O que interessa ainda para eles é referenciar para onde se pratique a tabela mais baixa. E isso se torna mais ineficiente e “caro” para todos, ao final. De novo, a teoria da soma zero reinando.
Então como sair de um modelo que não percebe valor no resultado e olha apenas para os números iniciais? Lembro então do dito popular, “o que não se aprende pelo amor, se aprende pela dor”. Teria então essa máxima alguma ligação com o momento catastrófico que estamos vivenciando no modelo de financiamento da saúde suplementar?
Infelizmente o que tenho visto e escutado e “ferido aos meus ouvidos” é que, nesse momento de dor, segundo fala de muitos gestores de operadoras é que as torneiras devem ser fechadas, as auditorias devem ser mais atuantes, o acesso deve ser restringido, deve se pagar menos aos prestadores e médicos e por aí vai. Lamentável. Mais um tiro no pé.
Entendo que motivados(?) pela dor, o sistema deveria estar focado no desenvolvimento de suas habilidades para fazer gestão de saúde, naquilo em que ele, com raras exceções nunca foi bom, em usar seus dados e informações para gerir seus riscos, mitigar riscos de suas carteiras, digo os epidemiológicos e não financeiros, apenas. O sistema nunca foi orientado a isso, prova é que ao adentrar em uma operadora e questioná-los quanto a esses ricos, poucos o conhecem e tem propriedade para falar sobre eles. No muito sabem dizer quais contas e clientes gastam mais, quais são mais lucrativos, quando existem. Mas do risco mesmo, de suas evoluções, do comportamento e do perfil de saúde de suas carteiras, é muito raro, muito. Seria o mínimo já que seus negócios estão aí centrados.
Se não bastasse o mínimo, que elas não fazem ou fazem de forma míope, quanto mais discutir novas relações de financiamento do sistema que devem ser mensurados após avaliados. Mas digo que sem essa discussão a sustentabilidade fica comprometida, totalmente.
Alternativas para a introdução de modelos mais longitudinais e que valorizam o valor como resultados, evitando desperdícios, racionalizando seus investimentos e alocando seus recursos onde devem ser alocados é necessário. Mas dá trabalho e leva tempo, se é que teremos.
Estamos conseguindo no projeto do Hospital São Marcos, aos poucos, mediante a apresentação de cases construídos com fatos e dados, comprovar junto aos seus financiadores que a resolutividade é o ponto chave. Quando ofertamos uma diária que pode de início ser mais alta que a de um concorrente, mas comprovamos ao final que ele, financiador, encontra no HSM melhores indicadores de diárias por internação, taxas de reinternação muito menores que as praticadas pelo mercado e alta satisfação dos pacientes e seus familiares, o que reduz seus índices de reclamações em NIPS junto a ANS, não há mais o que se conversar. Passamos para uma relação ganha-ganha e com isso, implantamos valor em nosso sistema de saúde. Fato.
Neste ano, em continuidade a ressignificação do seu modelo estratégico, o HSM iniciou seus estudos e projetos rumo a busca de novos modelos de remuneração e valor para seu corpo clínico, posicionando a instituição como uma das protagonistas na implantação de modelos que gerem mais valor ao sistema de saúde do nosso país e dos nossos profissionais. Da mesma forma novos modelos de remuneração, baseadas em valor, serão tratadas e negociadas com seus financiadores.
Nosso trabalho, em conjunto com o HSM, tem mostrado que os resultados para os envolvidos, quando compartilhados, geram mais efetividade e valor para toda a cadeia produtiva da saúde em nosso país trazendo uma luz no fim do túnel para a sustentabilidade de nosso sistema.
Luiz Coelho